ARTIGO: Militão, Maria, José, Tadeu e Santa Fé

Por Tadeu Bento França - Professor universitário, vereador em Maringá, deputado estadual, deputado federal constituinte e primeiro secretário de Estado do Meio Ambiente do Paraná.

ARTIGO: Militão, Maria, José, Tadeu e Santa Fé

foto - Reprodução vídeo Fundação de Santa Fé - youtube - Taiz Fânia Raiti

Era o ano de 1941. O mundo estava em guerra, mas no verde das matas do norte do Paraná, tudo respirava a silêncio e paz. Um estranho aventureiro recém- chegado à terra roxa paranaense, mas que viera de Arraias, norte de Goiás, hoje Tocantins e que mais tarde seria o meu pai, bateu à porta de um rancho com paredes de troncos de palmito e coberto de sapé, num futuro cafezal que substituiria as árvores derrubadas a foice e ao machado.

 

Uma adolescente de 14 anos idade gritou do interior do rancho:
– Quem é?
– Eu queria falar com o senhor seu pai.
– Tá na roça. Pera aí que já vou conversar com o senhor – prontificou- se a menina, depois de examinar o forasteiro por uma janela.
– Bom dia, mocinha. Qual é a sua graça?
– Maria. Se for por inteiro: Maria Gonçalves da Silva. E a graça do moço ?
– Militão, seu criado. Por inteiro: Militão Bento França.
– Espere só um instantinho. Vou levar o de comer pra roça. Meu pai e a minha mãe enfrentam o trabalho pesado E já volto com o meu pai.
– Então eu vou com você até ele. Mas se você pudesse repartir comigo um cadinho da
comida.

A moça compadeceu- se do rapaz. Ele insistiu:
– É só um prato de comida a um boiadeiro que veio de longe: lá do sertão de Goiás. Já estou sem a carne seca, a farinha e a rapadura, que a minha mãe me havia preparado em grande quantidade na hora do adeus.

A menina pensou. Se fosse dinheiro era difícil de arrumar, mas negar um prato de comida é coisa que o pai mineiro de São Sebastião do Paraíso ensinou a nunca negar.
– Se o moço esperar um pouquinho só, garanto que não haverá de lhe faltar o arroz com feijão , tudo com um pouquinho de couve, farinha de milho e molho de frango que a minha mãe me ensinou a fazer, bem do jeitinho das Gerais.

O goiano abaixou a cabeça envergonhado, por sentir- se faminto e obrigado a pedir o alimento.
– Espere mais pouco, que vou lhe fritar um ovo. Sua carinha é de muita fome.

Ao avistarem os dois, o mineiro José, pai de Maria, o entendimento foi rápido. O que valia mesmo era a palavra empenhada, o fio de bigode O goiano trabalharia na empreita de três anos acertada pelo mineiro com o dono da terra. José era um roceiro migrante que sonhava com o próprio pedaço de chão e garantir a fartura para a família.

Ao completar dezesseis anos, veio o casamento de Maria com o goiano. José comprou o pedaço de chão no Vale do Ivaí. Já o Militão preferiu fazer- se corretor a serviço da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná.

Santa Fé, em minha vida,
Não me esquecerei de ti.
Oh Santa Fé, oh minha terra querida,
Foi num rancho que eu nasci.

O valor das matas era pequeno de tal forma, que às vezes serviam como parte da comissão paga aos corretores que assim o desejassem. O meu pai aliou- se a um sócio também corretor, Lupércio Caressato e os dois foram somando porções cada vez maiores de florestas nas proximidades do rio Bandeirantes do Norte, constituíram a Imobiliária Santa Fé e promoveram o loteamento das propriedades rurais e urbanas que, no após- guerra, deram origem à pequenina, mas graciosa cidade de Santa Fé do Paraná.