A solução apontada pelos cientistas para interromper a disseminação das variantes existentes, bem como evitar o surgimento de outras cepas, é impedir a circulação do vírus. “É essencial continuar com o bom senso e o esforço coletivos, mantendo as atitudes de prevenção, como o isolamento e o distanciamento social, o uso correto de máscaras e a higiene das mãos”, explica a professora Juliana Maurer, do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da UFPR, uma das pesquisadoras que respondeu às perguntas da sociedade.
Além de Juliana e Roseli, colaboraram para esta edição do Pergunte aos Cientistas Emanuel Maltempi de Souza, professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular e presidente da Comissão de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19 da UFPR; Alexandra Acco (professora) e Maria Carolina Stipp (aluna de pós-graduação) do Departamento de Farmacologia da Universidade; Patrícia Dalzoto e Vânia Vicente, professoras do Departamento de Patologia Básica; Douglas Adamoski, do Departamento de Genética da UFPR; Ricardo Belmonte-Lopes, aluno do Programa de Pós-graduação em Microbiologia, Parasitologia e Patologia; e Bruno Lustosa, estudante do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia da Universidade. Confira abaixo as respostas dos cientistas.
A vacina Pfizer/BioNTech utiliza a tecnologia do RNA mensageiro (mRNA). Ela contém a informação genética para a proteína S do vírus na forma de mRNA e essa molécula é capaz de estimular fortemente o nosso sistema imune, levando à produção de anticorpos. O imunizante da Moderna também utiliza a tecnologia do mRNA.
A vacina Sputnik-V também emprega vetores virais não replicantes para estimular a produção de anticorpos, mas no caso dessa vacina, são dois adenovírus diferentes, em cada uma das doses.
O imunizante da Janssen/Johnson & Johnson também utiliza um adenovírus modificado com material genético de SARS-CoV-2, mas, ao contrário das vacinas citadas anteriormente, é necessária apenas uma dose para alcançar a imunidade desejada.
No caso das novas variantes, as vacinas continuam efetivas, a menos que ocorra uma alteração significativa nas proteínas de superfície do vírus, de modo que os anticorpos produzidos não reconheçam mais essas proteínas e não sejam mais capazes de neutralizar o vírus.
Portanto, é importante controlar a disseminação viral, fazer com que o vírus diminua a circulação e, em consequência, reduza sua multiplicação. Isso limitará o surgimento de novas variantes e diminuirá o risco de surgirem modificações que não sejam contempladas pelas vacinas utilizadas até o momento. Até que 70% a 80% da população seja vacinada, devemos continuar mantendo o distanciamento social, usando máscaras e fazendo a higiene das mãos.
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Maria de Fátima. Infelizmente, para a identificação das variantes são necessários testes laboratoriais, sendo dois os principais tipos. Um deles consiste no sequenciamento do genoma do vírus, que é o processo de conhecer toda a informação presente na “receita” que o vírus SARS-CoV-2 utiliza para fazer cópias de si mesmo, processo bem mais demorado que o exame tradicional de diagnóstico (a RT-PCR) e com custo elevado. A outra estratégia envolve utilizar justamente modificações da RT-PCR que permitam separar grosseiramente variantes já conhecidas. Como vantagens, a segunda estratégia é mais rápida e barata, mas não permite descobrir com segurança novas variantes, somente avaliar a presença das já conhecidas.
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Julia. O processo evolutivo tem um grande conjunto de possibilidades e, sim, seria possível uma variante que afetasse mais crianças e menores de 18 anos. Entretanto, mesmo sem o surgimento de uma nova variante, vamos observar esse efeito com o avançar da vacinação: com as populações de maior idade reduzindo a circulação do vírus, a tendência é que, proporcionalmente, vamos observar mais casos entre pessoas jovens. O ponto positivo é que várias vacinas já estão em teste para a aplicação nesses grupos específicos. Por exemplo, a vacina ComiRNAty (Pfizer) já recebeu liberação em alguns países para aplicação acima de 12 anos e a CoronaVac (Sinovac) já pode ser aplicada em maiores de três anos na China. Assim, a vacinação também vai alcançar esses grupos.
O que está bem claro é que a vacinação mundial em massa é a forma mais eficiente de controlar a pandemia, e até que isso não avance, os cuidados individuais e coletivos são fundamentais (máscaras, distanciamento social e higienização de mãos e ambientes), pois precisamos continuar reduzindo a chance de propagação do vírus, reduzindo o risco de sermos expostos e de expor outras pessoas ao vírus. Essas medidas funcionam contra todas as variantes, reduzindo a quantidade de transmissão viral e diminuindo as chances de o vírus sofrer mais mutações. À medida que mais pessoas são vacinadas, espera-se que a circulação do vírus diminua, o que também levará a menos mutações e variantes, e consequentemente, ao controle da pandemia. Porém, não sabemos se o tempo para isso será “breve” como a Gabriela mencionou na pergunta, pois dependerá da velocidade de vacinação em nosso país e no mundo todo.
Emanuel Maltempi, cientista UFPR – Obrigado pela pergunta, Valéria. Fala-se tanto das diferenças das variantes que é comum se achar que se trata de outro vírus. Na verdade, todas as variantes do coronavírus têm o mesmo tamanho e são transmitidas pelas gotículas e aerossóis que emitimos quando falamos, tossimos ou espirramos. Assim, os meios de impedir a transmissão são eficientes para todas as variantes. As máscaras do tipo PFF2, N95 ou KN95 conferem o mesmo nível de proteção. O distanciamento social também. As variantes de preocupação são mais transmissíveis porque têm mais vírus nas gotículas e, principalmente, essas variantes são capazes de grudar com muito mais eficiência nas nossas células.
Juliana Maurer, cientista UFPR – Olá, Kátia, agradecemos pela sua participação. De forma simplificada, pode-se dizer que quanto maior o número de pessoas infectadas, maior a oportunidade para o aparecimento de novas variantes. Quanto maior o número de casos ativos, ou seja, pessoas com o vírus, maior será a possibilidade para o aparecimento das variantes. Vamos explicar, simplificadamente, sobre a biologia do vírus e como as variantes podem ser geradas para tentar esclarecer melhor. O vírus é um organismo intracelular obrigatório, que significa que o vírus depende da célula hospedeira para se multiplicar. Então, após entrar dentro da célula, ele começa o processo de replicação e expressão gênica, e é nessa etapa que são feitas cópias do material genético do vírus para formar novos vírus. Como esse processo é muito rápido, podem ocorrer mutações ou mudanças no material genético durante essa etapa. Assim, as variantes virais são aquelas que apresentam qualquer alteração do material genético comparando com o material genético do vírus original. Nem toda mutação será benéfica para o vírus. Porém, se as mutações resultarem em um vírus mais transmissível, que provoque agravamento dos sintomas, que escape da resposta imunológica, ou que diminua a eficácia de terapêuticas e vacinas, essas mutações vão tornar os vírus mais eficazes “no propósito de ser um agente infeccioso”. Desta forma, para impedir o surgimento de novas variantes, é essencial continuar com o bom senso e o esforço coletivos, mantendo as atitudes de prevenção (isolamento e o distanciamento social, uso correto de máscaras e a higiene das mãos). Aliada a essas medidas, a vacinação em massa é uma medida eficaz e necessária para diminuir a taxa de infecção e assim o surgimento de novas variantes.