Este último domingo do mês dAe setembro é o Dia da Bíblia. Ouçamos do salmista, seu humilde reconhecimento: “Tua Palavra é lâmpada para os meus pés e luz para o meu caminho” (Sl 119, 105). Jesus, por sua vez, encerra o seu sermão da montanha advertindo-nos:
“Nem todo aquele que me disser, Senhor, Senhor! entrará no reino de Deus, mas aquele que cumprir a vontade do meu Pai que está no céu. […] Assim, pois, quem escuta as minhas palavras e as põe em prática, parece-se com um homem prudente que construiu a casa sobre a rocha” (Mt 7, 21, 24). No evangelho deste domingo, encontramos três ensinamentos preciosos de Jesus aos seus seguidores de ontem e de hoje. No primeiro, o apóstolo João vem comunicar a Jesus: “Mestre, vimos um homem expulsando demônios em teu nome. Mas nós o proibimos, porque ele não nos segue” (Mc 9, 38). O foco de João e seus companheiros não é alegria do homem que saiu liberto e curado, mas a ciumeira do grupo que pretende ter o monopólio de Jesus, do seu anúncio e do seu poder de cura. A resposta de Jesus é direta e inteiramente contrária à prática do grupo: “Não o proibais… Quem não é contra nós, é a nosso favor” (9, 39-40). Pagola comenta: “Jesus rejeita a atitude sectária e excludente de seus discípulos que só pensam em seu prestígio e crescimento e adota uma atitude aberta e inclusiva, na qual a primeira coisa a fazer é libertar o ser humano daquilo que o escraviza e destrói. É este o Espírito que deve animar sempre seus verdadeiros seguidores”. Aprendamos a acolher, louvar, reconhecer e apoiar todo e qualquer bem que é feito por pessoas, grupos, comunidades que se empenham pela justiça, pela paz, pelo socorro aos mais necessitados. O segundo ensinamento ilumina o primeiro. Essas pessoas que fazem o bem entram no rol daqueles que são reconhecidos e recompensados por Deus, até mesmo por um copo de água fria dado a quem o pede (9, 41). E por último, Jesus arremata a conversa com os discípulos com exemplos que querem mostrar a gravidade do que está dizendo, mas que aos discípulos e a nós soam como desconcertantes e inaceitáveis, mesmo se os tomamos em sentido figurado. Trata-se do escândalo dado aos pequenos: “E se alguém escandalizar um destes pequeninos que creem, melhor seria que fosse jogado ao mar com uma pedra de moinho amarrada ao pescoço” (9, 42). Seguem as comparações chocantes: “Se tua mão te leva a pecar, corta-a. É melhor entrar na vida sem uma das mãos do que tendo as duas, ir para o inferno…” (9, 43). As mãos nos remetem ao trabalho, ao ganha pão diário, ao mundo da economia. Aí, o pecado é aceitar como normal, e não como escândalo inaceitável, o abismo das desigualdades econômicas e sociais e que, como disse o Papa João Paulo II, na abertura da Conferência de Puebla: “… haja, no nosso mundo, ricos, cada vez mais ricos, às custas de pobres casa vez mais pobres”. Mãos que se fecham e que não sabem partilhar, corações que se endureceram e foram tomados pela indiferença e a insensibilidade pecam contra a virtude maior de todas, a virtude da caridade que envolve a justiça e a partilha dos bens deste mundo. Deus é amor, no dizer de São João. Jesus fala também do pé. Se ele escandaliza, corta-o. É melhor entrar manco na vida eterna. Os pés nos permitem caminhar, mirar o horizonte e carregam a virtude da esperança. Se roubamos a esperança dos pequenos, porque os convencemos que o mundo não tem mais jeito e nada pode ser mudado, os condenamos ao desespero. Pecamos, sobretudo, se não abraçamos as causas que brotam do seu sofrimento e de suas necessidades e os condenamos a ficar parados ou a retroceder, como Elias que pediu a morte, mas que foi sacudido pelo anjo: Levanta-te e põe-te a caminho. Por último, diz Jesus que é melhor arrancar o olho, que escandaliza e entrar caolho no reino dos céus. A virtude dos olhos, é a fé que no permite enxergar para além das aparências. Pecamos contra essa virtude se embaralhamos a realidade, criamos mundos paralelos e fantasiosos, povoados de mentiras e discursos de ódio. Vamos devolver a limpidez do olhar e nos ajudarmos mutuamente para manter acesa a luz de Deus que ilumina nossos passos, para não sermos cegos e guia de cegos.