Os cuidados paliativos são indicados para pessoas com doenças ameaçadoras da vida, como câncer avançado, doenças neurológicas degenerativas, insuficiências orgânicas crônicas e outras condições de alta complexidade. O serviço tem como objetivo aliviar sintomas, controlar a dor e oferecer suporte emocional, social e espiritual, com envolvimento ativo da família e da equipe de saúde. O processo será feito em consonância com o serviço municipal de Saúde, via Serviço de Atenção Domiciliar (SAD).
O SAD é oferecido pelo SUS em todo o Brasil e visa à promoção dos cuidados paliativos em casa, para evitar hospitalizações desnecessárias e oferecer mais qualidade de vida aos pacientes paliativos. Através de protocolos, o SAD monitora e autoriza a ida de pacientes paliativos, dos hospitais de referência para a residência, desde que haja o cumprimento dos critérios para desospitalização – o que impede, inclusive, a reospitalização desses pacientes.
Na última semana, a comissão de implantação do serviço no HUM realizou uma conversa com os residentes, servidores e voluntários. No encontro, a coordenadora da equipe multidisciplinar, a enfermeira Caroline Monteschio, apresentou o conceito de cuidados paliativos e os principais desafios enfrentados pelo hospital para a implantação: uma transição de cultura, de uma instituição – assim como muitas no Brasil – predominantemente hospitalocêntrica e curativa para uma prática que valoriza o cuidado integral até o fim da vida.
Para o reitor, Leandro Vanalli, a implantação do serviço no Hospital Universitário da UEM representa um avanço significativo na assistência à saúde. Ele comenta que essa iniciativa visa proporcionar um tratamento mais humanizado e confortável, permitindo que os pacientes recebam os cuidados necessários no ambiente familiar. “A humanização do cuidado, ao receberem tratamento em casa, permite aos pacientes desfrutarem de um ambiente mais acolhedor e familiar, o que contribui para o bem-estar emocional e psicológico. O serviço oferece suporte e orientação aos familiares, capacitando-os para auxiliar nos cuidados e lidar com as demandas do paciente”.
O grupo responsável pela implantação no Hospital é composto, além de Caroline, por Sanderland Tavares Gugel, Egle Pereira Leão, Emanuela Lucas Dias, Luana Cristina Pinheiro da Silva, Aroldo Gavioli, Maria de Lourdes Leon e Lucia Brolese.
“Se comemoramos sempre a vida, por que o final deve ser triste?”
Quando se fala em cuidados paliativos, muitos imaginam pacientes muito idosos, sem condições de desenvolver atividades cotidianas e que necessitam de ajuda para tudo. No entanto, não é bem este cenário que as equipes de saúde enfrentam no cotidiano. “O paciente em cuidados paliativos pode, muitas vezes, viver por anos, daí a importância de oferecer um serviço prolongado e centrado no conforto e na dignidade aos pacientes”, explica Caroline.
Toda essa engenharia implicará numa série de mudanças de paradigma para as equipes do HUM. “A equipe multidisciplinar envolvida deve pensar na desospitalização desse paciente, que por si já tem um alto custo para os sistemas de saúde, logo que ele entra no Hospital”, avalia a enfermeira.
Além do enfermeiro navegador, figura basilar do trabalho de cuidados paliativos que atua como facilitador junto aos serviços de saúde, a equipe deve ser composta por médico paliativista, psicólogo, assistente social e fisioterapeuta. “Em cuidados paliativos, não existe alta total do paciente. O hospital de referência é colocado como referência desse paciente assim que ele sai”, explica Caroline.
Com o avanço da idade da população brasileira, o número de pessoas que necessitam de cuidados paliativos tem aumentado. Segundo o Ministério da Saúde, cerca de 620 mil pacientes no Brasil necessitam de cuidados paliativos. “Conforme a população envelhece, nós temos um aumento do número de idosos com doenças crônicas não transmissíveis. Como uma parte importante da população não cuida da saúde antes de os problemas aparecerem, a intenção é que esse número de pacientes que necessitam de uma abordagem paliativista aumente ainda mais”, explicou.
“Os pacientes paliativos e suas famílias querem um atendimento total, e isso implica em uma mudança da nossa parte em comunicá-los da necessidade dos cuidados paliativos em casa, caso haja uma estrutura adequada para isso. Nós costumamos comemorar a vida, os nascimentos, mas é muito difícil alguém querer morrer em uma unidade de saúde. Essa pessoa deve estar rodeada de amigos, familiares, da sua rede de apoio”, finalizou.
Exercício de empatia
Segundo a diretora de Enfermagem do HUM, Silvia Saalfeld, toda a equipe multiprofissional deve exercitar a empatia para, ao fim, conseguir entregar um serviço de qualidade aos pacientes atendidos, o principal objetivo de uma equipe paliativa. “Se nós não nos colocarmos no lugar daquele paciente, daquela família, que passa por uma dor específica, não vamos conseguir compreender o que isso (cuidado paliativo) significa. Nós temos de pensar: e se fossem nossos pais, nossos avós? Como reagiríamos à ideia de levá-los para casa e acompanhar esse processo difícil de perto”, questionou.
Recentemente, a direção do Hospital recebeu a enfermeira Esperanza Begoña Garcia Navarro, da Universidade de Huelva, na Espanha. Especialista em cuidados paliativos, Esperanza veio para dividir conhecimentos com a equipe do serviço, além de contribuir para a implementação dos cuidados paliativos com sua experiência.
Morte moderna
Para o médico Sanderland José Tavares Gurgel, que compõe a comissão multiprofissional de cuidados paliativos do HUM, o mundo passou a encarar o caminho para a morte de forma diferente a partir dos anos 1950, com o fim de duas grandes guerras. “As pessoas passaram a administrar a morte nos quartos de UTI, em enfermarias, distante dos familiares. Imaginamos que, se elas tivessem escolha para isso, em alguns casos prefeririam passar com entes queridos, dentro do contexto familiar e sob cuidados, e não passar o resto da vida com um horário restrito de visita, por exemplo”, explica.
O médico, especialista em cuidados paliativos, acrescenta o caráter espiritual e até religioso dos cuidados paliativos, além do financeiro. “Muitos não vêm ver o ente no hospital porque não têm dinheiro. É algo para o qual também temos de nos voltar”. O médico pontuou que a administração do Hospital segue apoiando o projeto, ao enxergar nos cuidados paliativos um método para aliviar o sofrimento e prolongar o bem-estar do paciente. “A partir do momento que se constata que não há uma cura, ainda há muito o que fazer para aliviar, apoiar e acolher, e este é o compromisso do Hospital Universitário de Maringá.”
ASC/HUM