Morre Walmor Macarini, lenda do jornalismo paranaense

Por Edilson Pereira, jornalista e escritor.

foto: arquivo pessoal rede social

UMA LENDA SE FOI – Levantei por volta de seis horas, porque hoje era o dia da diarista limpar a casa. Mas como ela mora em Mandaguari, pegou pneumonia, achou melhor não tomar chuva. A empregada não veio. Hoje é aniversário do meu filho Samuel, escrevi o texto a respeito e depois fui a uma agência da Caixa a três quadras de casa pagar a diarista que limpa o apartamento em Curitiba. Faço isso uma vez por mês. Está chovendo em todo o Paraná, mas as coisas têm que ser feitas. Sai da Caixa e o Montezuma Cruz me ligou de Porto Velho onde mora e onde também está chovendo: “O Walmor morreu!”.

Walmor Macarini, 86 anos, foi uma figura marcante em minha vida profissional. Polêmico, criativo, maluco, divertido, engraçado, falante, amigo, o Walmor era tudo ao mesmo tempo. Como ninguém é perfeito, virou bolsonarista na onda de direita que assolou o país. E ainda escreveu artigos que eu considerava equivocados. Disse isso para ele. E acho que não gostou. Mas é inegável que deixou um legado enorme. Sem ele a Folha de Londrina não seria o que foi, ainda que o maior mérito seja de seu tio João Milanez, que a construiu “tijolo por tijolo”.

Walmor completava o Milanez. Em termos arquitetônicos poderia dizer que o Milanez construiu o edifício. E o Walmor deu acabamento e o decorou dando a ele visibilidade. Com ele no comando da redação a FL teve as suas melhores fases, com a Folha de Londrina Esportiva, com a Joana Lopes criando caderno de cultura sob a ditadura, Jotinha e Bernardo Pelegrini criando o Caderno 2 e muito mais. Ele tinha fome de novidades. Tenho pessoalmente uma gratidão com ele. Em agosto de 1984 tinha terminado o curso de Direito e pensava em ser advogado, depois de passar oito meses na sucursal de Paranavaí.

O Walmor me convidou para ir para Londrina e de cara me entregou a editoria de Política. Era coisa de gente ousada. Ele ousava. E dai para frente segui jornalista até me aposentar. Eu gostava dele mas cortava a onda quando ele começava a navegar na maionese. Um dia, nos anos 80, estávamos conversando na janela da redação numa boa. O Walmor era espírita ou coisa parecida. Ele viu um deficiente físico se arrastando na calçada diante do prédio do Correio e me disse: “Edilson, aquele homem é muito mais feliz que nós”.

Achei um absurdo. A situação do sujeito não inspirava aquele tipo de comparação e o Walmor não o conhecia. O argumento era que as pessoas infelizes e que sofrem são recompensadas na outra vida e dependendo da quantidade de sofrimento nem precisam reencarnar mais. O que para ele, seria uma beleza. Eu disse pra ele: “Se é assim, então pula pela janela que você vai se arrebentar lá em baixo e ficar mais feliz que ele”. Ele arregalou os olhos. E mudou de assunto na hora. Eu achava que estas observações eram simplificações de algo que nós desconhecemos.

Em outra ocasião, nos anos 90, ele me contou que tinha alugado a casa dele à beira do lago Igapó para um japonês bacana. Estava encantado com o inquilino. E me falou umas três vezes com entusiasmo sobre o japonês bacana. Eu até quis conhecer o japonês bacana, pois gosto da cultura japonesa e pensei que talvez o japonês pudesse ampliar os meus ralos conhecimentos sobre o oriente distante. Mas desisti de ideia quando a polícia federal baixou na casa do japonês bacana com dois helicópteros e metralhadoras e prendeu o sujeito. Que foi fotografado de cueca e tinha o corpo mais tatuado que os marinheiros de uma frota de navios piratas. O bacana era um dos chefões da Yakuza, máfia japonesa, escondido no Brasil. Walmor levou o maior susto.

Quando fui falar com ele, me atalhou: “Se for falar do japonês, vamos mudar de assunto!”. Em 1988, ele contratou o jornalista Montezuma Cruz para trabalhar em Londrina e não sei o que aconteceu que o Monte não podia ficar lá. Mas o Walmor tinha assumido o compromisso. Ele me ligou com diplomacia na sucursal de Maringá onde eu trabalhava e me indagou se por acaso eu me incomodava em trabalhar com um jornalista que ele contratou. “É o Montezuma, Edilson! Você deve conhecer!”. Eu conhecia o Montezuma porque foi correspondente da Agência Folhas. O editor de interior da Agência, o Fernando, sempre vinha falar comigo sobre ele.

Walmor perguntou: “Você acha que ele se encaixa aí na sucursal?” Eu respondi: “Claro que se encaixa. Pode mandar”. Ele ficou agradecido e eu perplexo. Ele era diretor do jornal. Não precisava pedir. Mas o Walmor também tinha as suas delicadezas. Só pelo fato de o Monte ter se tornado um grande amigo, já seria grato ao Walmor. Mas tem muito mais. Para escrever todas as histórias do Walmor é preciso mais que um livro. Mas não posso terminar sem dizer que ele era um sujeito que reconhecida o talento e incentivava a qualidade. Poucos são assim. Resumindo, tinha o jeitão dele. E foi o jeitão dele que ajudou a Folha de Londrina a ser um dos melhores jornais do País quando existia uma coisa chamada jornalismo impresso, cuja seriedade, embora com alguns defeitos, faz muita falta. Grande abraço, Walmor. Gracias por tudo! Publiquei uma foto em que vc tá bonitão, com a Lexicon 80. Inesquecível.