O Brasil enfrenta a pior seca de sua história recente, segundo dados do governo. Mais de um terço do território nacional sofre com a versão mais severa do fenômeno, incluindo a Amazônia.
A chefe do Escritório do Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef, em Manaus e Belém, disse que a situação é grave desde o ano passado. Em entrevista à ONU News, Debora Nandja, explicou que as crianças foram duramente afetadas pelo isolamento e perda de serviços essenciais.
Crianças mortas por falta de água e comida
“São histórias muito tristes de crianças que iniciaram na escola e depois pararam. Teve casos, por exemplo, de calendários escolares que ficaram super curtos porque na hora que começou a seca tinha que se correr para parar. E como é que fica a qualidade da aprendizagem? E aí as crianças iam passando assim de ano a ano e vamos ver esses problemas depois lá na frente, ou casos graves de desnutrição. Colegas nossos que foram em campo, da área de saúde e nutrição, que encontraram casos gravíssimos de desnutrição e até óbitos de crianças por falta de água e por falta de alimentos lá onde estão isoladas”.
Segundo o Unicef, existem 420 mil menores impactados na região amazônica do Brasil, Colômbia e Peru. No território brasileiro, os estados do Amazonas, Pará, Rondônia, Acre e Roraima declararam emergência.
Debora Nandja citou visitas realizadas por equipes da agência em 14 comunidades da Amazônia brasileira que atestaram que metade das famílias estão com as crianças fora da escola e sem acesso a comida.
Populações indígenas são as mais afetadas
Ela lembrou que a região vive em função dos rios, pois eles servem para transportar água, alimentos, combustível, suprimentos médicos e funcionam como rota para chegar nas escolas e unidades de saúde. Ela ressaltou que com o esvaziamento das águas, “tudo é afetado”, com impactos mais graves nos povos indígenas.
“O rio, na verdade é a rua, é o caminho, é o meio de locomoção, é tudo para eles. Estar sem o rio é uma tragédia muito séria para as populações indígenas. E lá é onde estamos e onde tentamos chegar, tanto nas populações indígenas como nas populações ribeirinhas. Mas certamente as populações indígenas são as mais afetadas. É onde devemos tentar chegar com pressa e com algo palpável para que eles possam cada vez mais estar prontos para essas mudanças climáticas”.
Dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, Cemaden, mostram que, em setembro, 52 terras indígenas foram classificadas com condição de seca extrema e 142, com seca severa.
Ações de curto e médio prazo
O Unicef investe em medidas de preparação como capacitação de equipes de saúde para identificar os primeiros sinais da desnutrição, infraestrutura para armazenar água por períodos mais longos, adaptações no calendário escolar e suporte para ensino a distância.
Essas medidas se tornam ainda mais importante perante previsões de que a situação da seca possa se repetir nos próximos anos. Para a resposta de curto prazo, o Unicef fez um apelo de US$ 10 milhões voltado para as necessidades mais urgentes no Brasil, na Colômbia e no Peru.
O valor será investido em distribuição de água e suprimentos essenciais, medicamentos, mobilização de brigadas de saúde, apoio à educação e ao saneamento e serviços de proteção dos menores contra a violência.
Da COP29 à COP30
A chefe do Escritório do Unicef na Amazônia disse que os líderes mundiais reunidos na 29ª Conferência da ONU sobre Mudança Climática, a COP29, em Baku no Azerbaijão precisam abordar a crise do clima tendo em mente os impactos que ela causa nas crianças.
“Estamos deixando que tipo de planeta para essas crianças? Porque nós nos vamos daqui a pouco. E essas mudanças climáticas estão a afetar a vida deles hoje e vão continuar a afetar. Então, nós precisamos realmente trazer essas discussões. Estamos agora na COP 29, vamos para a COP 30, a COP 30 vai ser no Brasil e precisamos ter isso muito bem organizado e discutido para tomarmos decisões, para que os governos todos que estiverem em Belém possam tomar decisões com vistas a um futuro melhor para essas crianças e esses adolescentes”.
Debora Nandja destacou que essa priorização dos menores deve se refletir no aumento de financiamento para a proteção deste grupo e na capacitação para que
crianças e adolescentes participem ativamente nas tomadas de decisões sobre mudanças climáticas que afetam a vida deles. onu news