Um representante comercial, que ocupava a função de gerente, teve reconhecido o seu vínculo de emprego junto a uma distribuidora de cosméticos de Curitiba-PR. Por outro lado, também foi reconhecida a demissão por justa causa aplicada pela empresa. O motivo: ele ofereceu ração de cachorro às funcionárias como presente pelo Dia Internacional das Mulheres. A decisão final foi da 2ª Turma de Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-PR).
O ex-gerente entrou com uma ação pedindo o reconhecimento de vínculo empregatício, já que contratado como pessoa jurídica. Também pediu a reversão da justa causa. O juiz de 1º Grau reconheceu o vínculo empregatício de agosto de 2020 a fevereiro de 2021. Quanto à justa causa, o ônus da prova era da empresa, que apresentou no processo um arquivo de vídeo e trouxe uma testemunha dos fatos. No vídeo, o ex-gerente aparece entrando na empresa com um pacote de ração para cachorro. Já a testemunha confirmou que o autor da ação ofereceu aquele pacote de ração como presente pelo Dia Internacional das Mulheres para um grupo de pelo menos 4 funcionárias. O autor, por sua vez, não fez nenhuma prova em sentido contrário.
A sentença confirmou a justa causa e foi didática ao explicar a presença dos três fatores para aplicação da punição: gravidade do fato, atualidade e imediação. “As vítimas compreenderam o ato como insinuação que fossem ‘cadelas’”, consta na decisão de 1º Grau. O caso tramitou na 17ª Vara do Trabalho de Curitiba em 1ª Instância. O autor ainda tentou modificar a decisão por meio de recurso, julgado pela 2ª Turma, sendo relator o desembargador Célio Horst Waldraff, atualmente presidente do TRT-PR na gestão 2023-2025.
A 2ª Turma confirmou a sentença de 1º Grau e ainda acolheu o recurso da empresa, que não teve que pagar férias proporcionais e nem 13ª salário proporcional. “Há a necessidade urgente de se enfrentar hierarquias estruturais que, costumeiramente, destinam à figura feminina um papel marginalizado na sociedade em geral e no próprio ambiente laboral. Tudo isso é reflexo do machismo estrutural, o preconceito contra as mulheres é a causa de atos e condutas discriminatórias de gênero, como a praticada pelo reclamante”, declarou o relator em sua decisão. O julgamento na 2ª Turma ocorreu em agosto de 2022 e em setembro do ano passado, o caso teve sua execução cumprida e foi arquivado.
Julgamento com Perspectiva de Gênero
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), pela Portaria CNJ nº 27/2021, editou o “Protocolo para julgamento com a perspectiva de gênero 2021”. Este Protocolo é uma orientação para todos os ramos do Judiciário e deve ser observado não apenas nos casos em julgamento mas também no próprio transcorrer do processo.
Segundo o desembargador Célio Horst Waldraff, relator do caso, o Protocolo busca julgamentos imparciais, nos quais as diferenças e desigualdades estruturais entre homens e mulheres devem ser levadas em consideração. “É procedimento fundamental para eliminar todas as formas de discriminação contra a mulher. A finalidade é a de se suprimir os estereótipos e, sobretudo, assegurar que o sistema de Justiça tome em consideração a ‘questão da credibilidade e do peso dado às vozes, aos argumentos e depoimentos das mulheres, como partes e testemunhas’”, afirma o desembargador na decisão. ASC/TRT