O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) expediu determinações e recomendações ao Município de Maringá para orientar melhorias na gestão do sistema de transporte público coletivo dessa importante cidade da Região Norte do Estado. As medidas foram sugeridas pela Coordenadoria de Auditorias (CAUD) do TCE-PR, que detectou oportunidades de melhoria em fiscalização realizada no município.
As determinações foram expedidas no processo em que o TCE-PR julgou procedente Representação formulada pela CAUD em face do Município de Maringá, decorrente de auditoria prevista no Plano Anual de Fiscalização (PAF) de 2023 do Tribunal. O objetivo da fiscalização foi avaliar a gestão do sistema de transporte público coletivo municipal, no que diz respeito ao processo de planejamento para o início da operação, bem como ao acompanhamento contínuo do serviço e da execução contratual, inclusive para o controle dos custos.
Auditoria
O Relatório de Auditoria apontou oito achados – designação técnica utilizada para classificar impropriedades ou oportunidades de melhoria identificadas em procedimentos de fiscalização -, para os quais a unidade de fiscalização sugeriu orientações à administração municipal. O achado relativo ao município não fazer a prospecção ou utilizar receitas não tarifárias para o contrato foi objeto de outro processo, no qual foi expedida recomendação à administração municipal; e, portanto, não foi tratado nesses autos.
“ACHADOS”
O primeiro dos outros sete achados diz respeito à deficiência na estruturação econômico-financeira do projeto licitado do transporte coletivo, em razão da ausência de elaboração de estudo econômico-financeiro e de utilização das séries históricas para estimar a demanda; da falta de elaboração de pesquisa de origem-destino domiciliar; e do prazo contratual não ter sido fixado com base em estudos econômico-financeiros.
O segundo refere-se à falta de elaboração de adequado planejamento do sistema de transporte coletivo, pois não foram promovidos planejamento e gestão integrados nos processos de tomada de decisão relacionados ao sistema de transporte público coletivo; e não foram realizados estudos relacionados ao planejamento contínuo operacional no âmbito da gestão e aos investimentos necessários ao aperfeiçoamento do sistema de transporte público coletivo.
O terceiro é relativo à inexistência de gestão adequada dos dados sobre o transporte público coletivo de modo a torná-los confiáveis para a tomada de decisão, pois o ITS – que agrupa dados de GPS e sistema de bilhetagem – ou sistema de bilhetagem (SBE) não está sob o controle do município; o poder público não tem acesso direto aos dados brutos; não realiza aferição de integridade dos dados constantes no sistema de bilhetagem; e os mecanismos utilizados pelo município para garantir a integridade dos dados relacionados ao sistema de transporte não são suficientes para reduzir a probabilidade e o impacto de perdas dos dados.
O quarto achado de auditoria diz respeito à falta de realização de acompanhamento periódico dos parâmetros financeiros do contrato, já que o município não acompanha periodicamente os parâmetros de custos, inclusive os relacionados aos ganhos de eficiência do setor; e também não acompanha a variação da taxa de oportunidade/custo médio ponderado de capital no momento dos investimentos e nem os investimentos já realizados.
O quinto refere-se à ausência de controles mínimos instituídos para acompanhar se os serviços de transporte público coletivo prestados aos usuários são eficientes sob os aspectos de tempo e comodidade, haja vista que há deficiências no regramento instituído no município estabelecendo parâmetros de qualidade na prestação do serviço de transporte; não houve estudos periódicos acerca da oferta e demanda de cada linha, com vistas a subsidiar a adequação do quantitativo de veículos; e o município não realiza registro ou controle sobre a lotação dos veículos.
O sexto é relativo ao fato de o planejamento das operações do transporte coletivo não ser orientado, dentre outros, por dados, informações e pesquisas relacionados à jornada dos usuários, diante da falta de realização de estudo, controle e pesquisa quanto à percepção dos usuários, com vistas a aplicá-los no planejamento das viagens; e da ausência de elaboração de relatórios anuais de gestão pela ouvidoria do município.
O último achado diz respeito à inadequação da infraestrutura do sistema, em face das condições gerais dos pontos de parada e entornos, bem como as condições gerais dos veículos não serem adequadas; e dos problemas de acessibilidade nos veículos e nos terminais.
Decisão
Na instrução do processo, a Coordenadoria de Gestão Municipal (CGM) do TCE-PR e o Ministério Público de Contas do Estado do Paraná (MPC-PR) opinaram pela procedência da Representação, com a expedição das determinações e recomendações sugeridas pela CAUD.
Ao fundamentar seu voto, o relator do processo, conselheiro Ivens Linhares, atual presidente do TCE-PR contextualizou que o sistema de transporte coletivo de Maringá passou por processo de licitação em 2011 -Edital de Concorrência Pública nº 1/11 -, mediante o qual foi concedida a prestação dos serviços para a empresa Transporte Coletivo Cidade Canção, por meio do Contrato nº 193/11, com o prazo de vigência de 20 anos de concessão e a possibilidade de prorrogação por igual período. Ele lembrou que a fiscalização foi realizada com base no processo licitatório e no contrato de concessão.
Linhares afirmou que, apesar dos esclarecimentos prestados pelo município e da efetiva adoção de algumas iniciativas para o saneamento das irregularidades, os achados identificados não foram saneados e permanecem.
O conselheiro ressaltou que a Lei Federal nº 8.987/95 (Lei de Concessões) prevê cláusulas contratuais mínimas, dentre as quais se destacam as dos incisos I a IV do artigo 232, as quais ensejam a obrigatoriedade de se calcular o custo de investimento da concessão e o custo de sua operacionalização; e que essa estimativa depende da prévia realização de estudos de demanda, nos termos do artigo 9º, parágrafo 1º, da Lei Nacional de Mobilidade Urbana.
O relator explicou que o inciso V do artigo 30 da Constituição Federal dispõe que compete ao município o acompanhamento do serviço de transporte público coletivo, integrando o seu planejamento com o de outras políticas públicas; e que esse planejamento intersetorial demanda que o ente constantemente realize análises e pesquisas acerca do que é preciso investir para a melhoria da mobilidade, da ocupação do solo, do sistema de transporte e de outras políticas, conforme as disposições dos artigos 6º, inciso I, e 22, inciso I, da Lei Federal nº 12.587/12.
Linhares mencionou que a aferição de integridade dos dados constantes no sistema de bilhetagem, bem como o acesso à totalidade de dados para fiscalização e planejamento da concessão, é essencial para a gestão estratégica, conforme disposto nos artigos 29 e 30 da Lei de Concessões.
O conselheiro também frisou que, independentemente do modelo tarifário adotado, o município deve zelar pelo adequado acompanhamento dos custos do serviço associado ao controle do valor da tarifa; e que é necessária a realização de estudos periódicos para a adequação e controle do serviço prestado em favor do bem-estar dos usuários, conforme disposições do artigo 6º, parágrafo 1º, da Lei de Concessões e dos artigos 10, I, e 14, I, da Lei Nacional de Mobilidade Urbana.
O relator salientou, ainda, que os artigos 13, incisos I, II, III e VI, 14 e o 15, parágrafo único, da Lei nº 13.460/17 estabelecem a obrigação de as ouvidorias elaborarem relatório de gestão anual a partir de manifestações dos usuários, com a indicação de falhas e sugestões de melhorias, o qual deve ser integralmente disponibilização na internet.
Finalmente, Linhares explicou que é necessária a afixação de adesivos relativos ao Símbolo Internacional de Acesso (SIA); das instruções de fixação de cadeira de rodas e cinto de segurança em área reservada à pessoa em cadeira de rodas (PCR); da indicação de área reservada ao uso para PCR ou pessoa com deficiência visual acompanhada de cão guia; e do contato da ouvidoria, que deve ser disponibilizado internamente ao salão de passageiros.
Os conselheiros aprovaram por unanimidade o voto do relator, na Sessão de Plenário Virtual nº 4/25 do Tribunal Pleno do TCE-PR, concluída em 13 de março. A decisão está expressa no Acórdão nº 479/25 – Tribunal Pleno, disponibilizado em 20 de março, na edição nº 3.407 do Diário Eletrônico do TCE-PR (DETC). O Município de Maringá ingressou com Embargos de Declaração (Processo nº 187112/25), apontando supostas omissões no acórdão. O recurso será julgado também pelo Tribunal Pleno. ASC/TCE-PR